El mar es un azar
¡Qué tentación echar una botella al mar! *
Era um desejo de infância. Quando pequeno, nas praias que eu frequentava, sonhava em topar com uma garrafa trazida pelas ondas até a areia, uma garrafa que traria mensagens de terras longínquas. Lembro de ouvir contar que minha tia, certa vez, encontrou uma garrafa com uma mensagem de alguém que estudava correntes marítimas. Esta história me fascinava. Sobretudo, fazia com que eu imaginasse encontrar também minha própria mensagem.
Há algumas semanas, folheando um livro do Amyr Klink que me chegara às mãos, deparei-me com uma passagem em que ele conta ter lançado ao mar, no Atlântico Norte, um vidro de Nescafé com um bilhete e uma pedrinha colhida na Antártida. Amyr tinha na cabeça que, segundo estatísticas, só uma em cada vinte mensagens jogadas assim eram recuperadas, mas apostou e recebeu uma resposta, sete meses depois, com a foto de um menino norueguês de dez anos que achara o seu vidro de Nescafé.
Na mesma noite em que li o trecho do livro, eu havia oferecido um jantar aqui em casa para uns amigos. Abrira uma garrafa de vinho que já estava há bastante tempo esperando a ocasião e alguém comentou que a garrafa era muito bonita. Guardei-a vazia, mesmo sem saber o que fazer com ela - um vaso de flores, talvez?
Às vésperas de partir para Ilha Grande, então, estava eu envolvido com o planejamento da travessia quando tudo voltou à minha memória - meu sonho de infância, a história da minha tia, a pedrinha do Amyr que foi parar na Noruega - no instante em que olhei para a garrafa vazia descansando pacientemente em cima da pia da cozinha e esperando seu destino. Não hesitei. Busquei papel e caneta, sentei-me e escrevi. Anotei, depois de consultar a carta náutica, a posição mais propícia para lançar a mensagem (na preamar, quando passássemos entre a Barra da Tijuca e o Recreio dos Bandeirantes). Sabia que era um pouco de pretensão querer que a mensagem chegasse longe, mas quem consegue me impedir de sonhar? Tampei a garrafa, lacrei e guardei-a cuidadosamente entre os objetos que seriam levados a bordo do Pandorga...
Então, quando chegou o momento, durante a
travessia, a garrafa voou da minha mão para as águas de um mar sereno. Porque viagem alguma se completa sem que se alimente o sonho ingênuo e infantil que guardamos conosco.
Pongo estos seis versos en mi botella al mar
con el secreto designio de que algún día
llegue a una playa casi desierta
y un niño la encuentre y la destape
y en lugar de versos extraiga piedritas
y socorros y alertas y caracoles. *
* Citações do uruguaio Mario Benedetti.