sábado, 5 de dezembro de 2009

Granada, eco de fantasias


Dale limosna, mujer,
que no hay en la vida nada
como la pena de ser
ciego en Granada.
Francisco Alarcón de Icaza
Granada, Andalucía (ou Andaluzia). Claro que a Espanha é um país de cultura vasta e complexa; mas eu considero Granada como a cidade que que se manifesta mais intensamente a atmosfera espanhola que aprendi a imaginar em casa e na escola. Aquela España de sangre y de sol.
Como tal, não é difícil adivinhar que, a despeito das belezas (e tanto Granada quanto a Andalucía de forma geral são plenas de belezas, sobretudo na arquitetura), a degustação plena desta região passa, principalmente, por um olhar atento à cultura local. Neste ponto, tive sorte: já na chegada (de trem, o que, na Europa, é todo um capítulo à parte), dirigi-me à hospedagem: nada menos que uma casa andaluza, simples mas completa e bem localizada, que tratei de alugar pessoalmente com irriquieta velhinha. Nenhum hotel ou pousada poderia ser mais pitoresco.
Mas a viagem, na verdade, começara muito tempo antes, nas histórias de família (que vão muito além do Dominguez espanhol que trago no nome) e nos sonhos de conhecer o que havia do outro lado do oceano. A Espanha foi minha primeira e inesquecível viagem desta magnitude. E ofereceu um mosaico (de azulejos andaluzes, talvez) fascinante, juntando porções já imaginadas ou experimentadas por mim (a língua, um pouco da culinária, algumas histórias) com outras inteiramente novas (nada é pleno enquanto não é vivido de fato).
O palácio mouro da Alhambra, talvez a principal joia histórica e arquitetônica da Espanha, fica em Granada, e só ele já compensa a visita à cidade. Não vou me estender sobre outros pontos (o Generalife, a Catedral, o Monastério) que os guias já descrevem com precisão. Mas é encantador chamar a atenção para o que vai além disto tudo, para o clima de mistério que emana de todas estas paredes medievais. Caminhar pelo Albaicín, o labiríntico bairro antigo, é uma experiência única. Lá, assim, como na Alhambra, o visitante acaba envolvido por um clima de Mil e Uma Noites que talvez exista apenas em pouquíssimos outros lugares. A influência mourisca está em toda a parte, e é uma delícia mergulhar nas lendas românticas de Granada. Quase se sente a presença, por exemplo, do rei que, derrotado, chorou ao abandonar a cidade e acabou encantado, dentro de uma montanha, onde está há séculos reorganizando seu exército para a retomada de Granada. E se a escolha é por uma noite ao som do flamenco, poucas coisas se comparam a um espetáculo oferecido por ciganos dentro de uma das cavernas que habitam há séculos. Sente-se, de mistura ao cantar flamenco, o eco de fantasias de todos estes séculos.
Outros aspectos da Espanha estão lá, como em todo o país: as tapas, o jamón, algumas das inúmeras variedades da paella, para ficar só no campo gastronômico. O sol, a sesta. Os laranjais. Convites aos sentidos e à imaginação. Granada, já antes de os espanhóis inaugurarem a história da América, era um reino prenhe de histórias. E assim continua: um lugar onde os ecos do passado se multiplicam, confundindo a lenda e a realidade, para criar lembranças e ilusões maravilhosas em casa novo visitante.