quinta-feira, 21 de dezembro de 2017

Unindo as pontas da Europa

Pristina, Kosovo
Neste ano, passamos por dois dos países mais pobres e menos desenvolvidos da Europa - Kosovo e Albânia. Poucos meses depois, visitávamos dois países no extremo oposto da lista - os notoriamente ricos Liechtenstein e Suíça. A coincidência não foi planejada, tanto que só me dei conta dela algum tempo depois. Isso não quer dizer que não tenhamos podido fazer algumas comparações muito interessantes.
A viagem ao Kosovo fora sonhada e planejada durante bastante tempo. Estávamos um pouco apreensivos com o que encontraríamos lá, dado o histórico recente de conflito armado na região. Mas acabou sendo uma viagem muito tranquila (além de fascinante!). Na Albânia estivemos só de passagem, literalmente, mas vimos os impressionantes e onipresentes abrigos antibombas que estão por toda parte. Também aprendemos que o próprio Kosovo é, decididamente uma região (de etnia) albanesa.
Para visitar Suíça e Liechtenstein, estávamos bem mais despreocupados. Claro que qualquer viagem sempre requer algum planejamento, mas, neste caso, tudo era mais fácil: há informações fartas e detalhadas na Internet; são países (principalmente a Suíça) bastante habituados a receberem turistas; e, de quebra, têm uma longa tradição de não-envolvimento bélico (neste ponto, mais uma vez, o oposto do Kosovo).
Mas afinal... Como é estar lá realmente? Nada substitui a experiência real do lugar, e toda viagem sempre traz alguma surpresa. Então vamos por partes...
As pessoas
Praticamente todas as pessoas com quem conversamos no Kosovo são simpáticas e sorridentes. Mesmo em lugares simples, sentíamos que nosso interlocutor tinha um interesse genuíno na nossa presença ali, quase como se coubesse a ele retribuir o fato de receber visitas de tão longe. De certa forma, a hospitalidade faz parte da cultura albanesa. Não há como dizer que não fomos bem tratados!
Já na Suíça, não é que as pessoas não sejam simpáticas - longe disso. Mas são menos efusivas e mais fechadas. Coisas de um país maior (embora as cidades suíças nem sempre sejam tão maiores que as kosovares) e mais cosmopolita. Ainda assim, é difícil generalizar. No pequeno principado de Liechtenstein, por exemplo, fomos incrivelmente bem recebidos por uma de nossas anfitriãs, tivemos um curioso momento de conversa com operários de uma obra e não há como menosprezar o fato de que estivemos cara a cara com a família real no aniversário do país.

Triesenberg, Liechtenstein
Limpeza e organização
Aqui é onde a comparação se faz mais gritante. No Kosovo e na Albânia, o que se vê é de entristecer: rios lindíssimos, de águas azuis cristalinas, salpicados de lixo. Cães de rua revirando sujeira. Prédios abandonados. Parte o coração, e fica-se pensando o quanto disso tudo é culpa (ou consequência) da guerra. Afinal, um país que tem poucos recursos e precisa se reconstruir deve estabelecer prioridades... Mas, ao mesmo tempo em que essa contingência não ajuda em nada, é difícil acreditar que se trate só disso e não de algo mais profundo. Assim como o hábito balcânico de fumar sempre e em todo lugar, difícil de aceitar para quem não está acostumado.
A Suíça, por outro lado... é a Suíça. Não à toa virou exemplo de organização, pontualidade e limpeza para boa parte do mundo.
Comida
A culinária do Kosovo, como de outros lugares dos Bálcãs, reflete muito da antiga ocupação turca: no café da manhã (e no próprio café), no burek, na bebida à base de iogurte (ajran), no croquete (ćevapi)... São coisas que, embora saborosas, chamam-nos a atenção, antes de tudo, por serem levemente exóticas. Já na Suíça a comida não é exótica, pelo contrário: é a terra de alguns clássicos que eles sabem executar à perfeição e entre os quais reinam supremos o fondue e o chocolate ao leite.

Preços
Claro, é quase injusto comparar: os preços no Kosovo são bem mais baixos que na Suíça e ainda mais que em Liechtenstein. Quer dizer que estes últimos são países caros? Depende. Recebe-se pelo que se paga: serviços de primeira qualidade, transporte público farto, confiável e impecável (e, em alguns casos, gratuito); qualidade de vida. No Kosovo as coisas são mais baratas, mas é triste ver obras inacabadas, estruturas precárias, museus subutilizados... E, no final das contas, isso é o que dói mais: saber que a corrupção e a ineficiência privam muita gente de ter acesso a coisas que seriam básicas em outros lugares.

2 comentários:

Renata Teixeira disse...

Sim, nossa sede de conhecimento não se importa com a posição do país na lista de riquezas ou pobrezas desse mundão. A história vem antes de qualquer coisa. O Kosovo é tão albanês que até a biblioteca nacional tem detalhes em sua arquitetura homenageando os típicos chapeus albaneses. E é linda!
Eu me senti, assim como você, muito bem tratada no Kosovo! As pessoas tentam nos entender, tentam agradar, explicar seu país, isso é muito gostoso. Eu tenho aprendido muito como "rebecer" pessoas em nossas viagens. Ainda não tive a oportunidade de colocar em prática, mas espero que consiga dar tanto carinho quanto temos recebido.
Sobre a limpeza, muito triste ver que os kosovares estão tentando matar aqueles rios lindos como nós fizemos com os nossos nos grandes centros urbanos :-(

Eduardo Trindade disse...

A história, a cultura e todos esses aspectos intangíveis definem as experiências de viagem mais do que qualquer outra coisa. Já está ficando até repetitivo dizer isso. Mas, enfim, viagens para lugares com histórias assim tão ricas (e pouco conhecidas para nós até então) só podiam ser fantásticas. E instrutivas. Realmente muito bom viver isso contigo!