segunda-feira, 11 de julho de 2016

Nossa vizinha, a rainha

As coisas em Tórshavn não acontecem da mesma forma que em outros lugares. Saímos de casa de manhã cedo; ao passar pelo que parecia ser uma escola, vimos a rua toda decorada com balões coloridos e as crianças usando coroas de papelão. Lembrava vagamente uma festa infantil, e chegamos a calcular em que dia do mês estávamos, na hipótese de ser algum feriado junino.
Adiante, havia mais gente que se reunia e convergia para a praça em frente à catedral. Eram crianças com coroas feitas à mão e agitando bandeiras faroesas e dinamarquesas, mas também muitos adultos (bem, muitos, para os padrões faroeses, não chega a uma centena). Alguns vestiam o magnífico traje típico nacional. No centro, um grupo tocava música. Paramos para assistir. Logo após algumas canções, alguém se apresentou para discursar e vimos passar uma senhora elegante, impecavelmente vestindo também o traje faroês.
Tínhamos acabado de presenciar a chegada da rainha da Dinamarca às Ilhas Faroe e a sua recepção pelo Primeiro Ministro e pelo povo da capital.
Depois soubemos que é uma tradição da rainha visitar as ilhas durante o verão; e que, desta vez, ela viera sem a companhia de outros membros da família real, o que, segundo o jornal, causou um leve desapontamento entre os faroeses, que esperavam ver não só a rainha mas também alguns dos príncipes.
Foto: Renata Teixeira
Também soubemos que o lindo barco que havíamos visto no porto é o histórico navio real, que serve à rainha em viagens como esta.
E, de quebra, ficaram esclarecidos dois fatos que haviam chamado a atenção: a quantidade de bandeiras dinamarquesas hasteadas e a quantidade de policiais nas ruas. Eu não lembrava de ter visto um policial sequer nas viagens anteriores e ficara um pouco triste com a presença deles (mesmo em quantidade minúscula para qualquer cidade brasileira, eram muito mais do que eu esperava em Tórshavn), mas concluí que estavam lá por causa da rainha, tanto que, depois da visita, sumiram todos. Quanto às bandeiras, bem, sempre houvera mais bandeiras faroesas que dinamarquesas. Mas essas estavam lá também por causa da rainha, e chegamos a brincar que a população devia guardar umas bandeiras dinamarquesas no fundo do armário para usar apenas nessas ocasiões, quase como uma criança que quer se mostrar obediente quando a mãe chega em casa. A história, porém, talvez seja ainda um pouco mais singela, pois, uns dias depois, a cidade foi tomada por bandeiras islandesas (em prédios oficiais, casas e até nos ônibus) e, passados mais uns dias, foi a vez das bandeiras groenlandesas. Intrigado, levantei uma suspeita e a confirmei: as bandeiras tinham sido exibidas exatamente nos dias de feriado nacional da Islândia e da Groenlândia. Que forma mais simpática de homenagear os vizinhos nórdicos!
Mas a nossa história com a rainha não tinha terminado ainda. Em outra ocasião, estávamos chegando, de carro, em nossa casa no coração da cidade. Havia alguns policiais e fomos parados. Perguntei o que havia e recebi a resposta:
-É que nossa rainha está indo embora!
Paramos rapidamente o carro (ao saber que estávamos hospedados ali, o policial nos deixou passar) e saímos para a rua com uma missão particular: encontrar a rainha! Havia poucas pessoas por ali, mas a presença dos policiais permitia supor qual o caminho que a rainha usaria. Então vimos um carro preto parado em frente a uma casa, a poucos metros de nossa própria casa; a rainha chegou, entrou no carro e passou exatamente do nosso lado, com um sorriso que só as rainhas sabem ter, e passou acenando para nós. Nossa vizinha, a rainha da Dinamarca.

Um comentário:

Renata Teixeira disse...

Como eu queria ter guardado a minha coroa do Burger King para usa-la nesse dia! Estar de coroa também para homenagiar a rainha.
Imagina se eu estivesse usando a minha coroa quando a rainha acenou pra mim!!!!! Ia ser um luxo!
=D
Os policiais faroeses são como tanajuras antes do começo das chuvas: apareceram todos para a chegada da rainha e sumiram todos depois que ela foi embora. Deve ser muito bom viver um lugar onde se caminha sem medo, onde se usa celular nas ruas sem medo de ser roubado, onde se deixa a porta aberta..
As bandeiras!!!! Muito legal!!!
"Que forma mais simpática de homenagear os vizinhos nórdicos!" Simpático demais da conta!!!
Esse povo é um espetáculo!