De forma geral, dá para dizer que nos demos bem com a comida dos Emirados. Para começar, a oferta é tão variada quanto a quantidade de imigrantes que lá vivem, o que significa diferentes opções de cozinhas ocidentais, árabes, chinesas e sobretudo indianas. Sem contar que tínhamos quartos de hotel amplos e equipados para preparar nós mesmos algum lanche (o primeiro quarto em que ficamos tinha mesmo uma cozinha em estilo americano). Portanto, um prato cheio para exercitarmos a arte de investigar a oferta dos supermercados locais!
A tâmara é a estrela da comida árabe. Está em todos os lugares, de diferentes variedades e com diferentes apresentações - frescas ou secas, inteiras ou com os mais criativos recheios, desde lascas de limão até macadâmias. E as tamareiras são figura fácil na paisagem emiradense, seja nas cidades ou no deserto. Antes mesmo de descobrir tudo isso, descobrimos as tâmaras frescas num supermercado e compramos um punhado - mais precisamente, um cacho - para experimentarmos. À primeira mordida, decepcionamo-nos um pouco: aquelas frutas pequenas têm a consistência aproximada de uma pera, talvez um pouco mais duras, e são extremamente doces. A impressão é quase a de morder um torrão de açúcar, tão doce que chega a ser sem graça.
Indo além, fomos provando outras iguarias, como o falafel (bolinho árabe), o kebab, o samosa (pastel indiano) e até uma autêntica sfiha (esfirra). Eu tinha boas lembranças das culinárias da Turquia e da Índia, e isso me deixou mais confiante para provar comidas da mesma família. Confiante até demais. Num dos lugares em que jantamos, pedi um biryani (prato de arroz indiano) e o dito cujo teria sido uma boa escolha, não fosse a quantidade absurda de pimenta que me fez pensar que era aquilo que serviam em "Como treinar seu dragão". Cuspindo fogo, ataquei meu copo de lassi (iogurte indiano), apostando nele para refrescar a ardência da boca. Mas a coisa só ficou pior, porque o lassi, contrariando as bebidas doces a que estamos acostumados, tinha um bocado de sal e pimenta...
Apesar de tudo, sobrevivi, e sobrevieram experiências melhores. Nos dias seguintes, fui compensando a overdose de pimenta com várias tâmaras recheadas. Já aquelas tâmaras frescas, que havíamos comprado logo no começo da viagem, ficaram meio que esquecidas a um canto do quarto.
Seguimos. De Dubai, o próximo destino era Abu Dhabi. Obviamente levamos conosco as tâmaras, frescas e secas.
Em Abu Dhabi, nós nos hospedamos no hotel de uma cadeia internacional - definitivamente, os Emirados são a terra das grandes franquias de hotéis, não de pequenas pousadas ou de empreendimentos familiares.
Acontece que, ao voltarmos para o quarto depois do primeiro dia de passeio em Abu Dhabi, reparamos que estavam faltando duas frutas no cacho de tâmaras que havia ficado sobre a mesa. O sentimento foi de perplexidade. "Não... Não pode ser...", pensamos.
No outro dia, o número de tâmaras voltou a diminuir. Continuamos incrédulos.
Até que nos restou uma única tâmara presa ao cacho. O jeito foi reagir com ironia: "Será que a camareira vai ter coragem de comer a última tâmara? Mas quem come a última não casa... E se comer, será que vai deixar o galho vazio ou vai jogá-lo fora?"
Mais um dia, a tâmara continuava lá. Chegamos a pensar que ela estava a salvo.
Doce, doce ilusão: no dia seguinte, o cacho e a última tâmara tinham desaparecido sem deixar rastro, tão definitivamente que chegamos a duvidar de que os tínhamos visto alguma vez.