sábado, 25 de outubro de 2014

Na ilha dos puffins

O puffin, ou papagaio-do-mar, é a ave mais cativante que eu já vi. E não seria exagero dizer, como fez a Renata, que essa avezinha de bico laranja e olhos tristes mudou a nossa vida. Já contei um pouco dessa história aqui e ali, nas minhas postagens; assim, um leitor atento sabe que nos apaixonamos pelos puffins, mesmo sem tê-los visto, durante nossas férias nórdicas de 2013. E sabe também que um dos principais motivos para termos voltado às Ilhas Faroe em 2014, além do genuíno encanto pelo lugar como um todo, foi o desejo de ver os puffins.
Foi assim que, de um jeito bem natural, Mykines se tornou um destino de viagem indispensável. Trata-se de uma das menores ilhas faroesas, com uma população permanente de 14 pessoas, que é o paraíso das aves - e particularmente dos puffins.
Há quem vá a Mykines e volte no mesmo dia. Claro que iríamos querer mais do que isso. Com boa antecedência e por telefone (suponho que não haja Internet em Mykines), tratei de reservar um quarto na única pousada da ilha.
Quando chegamos, fomos recebidos no casarão de madeira por uma simpática moça sueca - Greta - que nos orientou a achar nosso quarto, no andar superior. Seguindo o que entendemos das instruções dela, passamos por uma porta, entramos no prédio geminado, subimos as escadas e, já no quarto, largamos nossas coisas. Retornamos. Greta nos perguntou se tínhamos achado o quarto, ao que respondemos que sim. Ela: "mas não ouvi o barulho de vocês na escada!" Descobrimos que tinhamos ido ao lugar errado... Um pouco envergonhados, voltamos lá, buscamos a bagagem e, agora sim, instalados no quarto certo, descemos novamente.
Tomamos um sorvete no andar de baixo da pousada, que também é a única lancheria da cidade. Tomamos apenas sorvete; economizávamos dinheiro por saber que não havia caixa eletrônico nem possibilidade de usar cartão na ilha. Greta conversava conosco e contava histórias. Em seguida saímos, ávidos que estávamos para procurar os puffins.
Para isso, há que se sair do vilarejo e tomar uma trilha subindo uma longa colina. Com a temperatura abaixo de 10 graus, começou a chover. Não desistimos, embora sentíssemos os sapatos e as roupas molhando; a ansiedade era tanta que continuamos subindo. Lá pelas tantas, eis que vemos um puffin! Um único, parado na relva, a meia distância... O bastante para ficarmos observando, admirados. Depois, vimos mais outro... Após algum tempo, saciada a ansiedade - considerando que chovia e que teríamos mais tempo para explorar a ilha no dia seguinte - resolvemos voltar à pousada. Com frio e com as roupas encharcadas (o que era crítico porque quase não tínhamos trazido mudas, deixáramos a maior parte da bagagem em Tórshavn), entramos no quarto. Enquanto eu bolava técnicas de secagem de meias, sapatos e calças, pendurando-os no aquecedor do quarto ou aproximando-os da lâmpada incandescente, a Renata foi tomar banho. Havia um banheiro ao lado do nosso quarto, mas que estava com a placa "Bad". Outra placa, na lancheria do andar de baixo, instruía a não usar aquele banheiro. Deduzimos que a alternativa era o do anexo, o que, apesar de um pouco incômodo, não chegou a nos surpreender. Foi só a observação da Renata após o banho, de que aquele banheiro do anexo "não era usado há muito tempo", que nos deixou com a pulga atrás da orelha... Resolvemos perguntar se podíamos usar o banheiro ao lado do nosso. "Claro!", a resposta. E lá fui eu, tentando esconder as orelhas asininas, afinal "bad", em feroês, na porta de um banheiro, só pode significar "banheiro", e nem em inglês significaria "defeituoso".
O dia seguinte foi dedicado a caminhar pela ilha, percorrendo a trilha que leva até o farol e através de uma curiosa ponte de madeira que, rigorosamente falando, atravessa o Atlântico. No caminho, ovelhas e várias espécies de aves. E principalmente, claro, os puffins! Não um ou dois, mas dezenas, centenas deles! Voando, boiando no mar, espalhados pela grama... Com seus passinhos, seu jeito único de levantar voo e de pousar... Estávamos realmente maravilhados com os puffins e perdemos até a noção do tempo, ali, observando-os. Passamos o dia assim: caminhando pela ilha e admirando as aves. De comida, para economizar, apenas lanchamos: chocolate e besteiras trazidas de Tórshavn. 
por Eduardo Trindade
Mas ainda não tínhamos esgotado nossa cota de "micos". De noite, a moça da pousada veio nos avisar: o café da manhã é servido no andar de baixo e está incluído na diária. O quê? Tínhamos passado as últimas mais de 24 h comendo quase nada, quando tínhamos um café da manhã à nossa disposição? Isso mesmo. Mas, àquela altura, só nos restava irmos dormir, esperando sonhar com puffins e com comida.
O café da manhã realmente valeu a pena (e nos fez sentir um pouco mais tolos por tê-lo perdido no dia anterior). Os puffins... Acho que, depois de tudo, não preciso acrescentar nada. Ainda vamos voltar a Mykines para visitá-los novamente!

Um comentário:

Renata Teixeira disse...

Os puffins!!!! Sim, essa avezinha encantadora mudou nossa vida, nossa forma de registrar nosso amor! Afinal quantas famílias conhecemos que tem um filhote tão elegante quanto um puffin? Aqueles olhinhos tristes nos fizeram retornar mais cedo do que pensávamos às Ilhas Faroé, enfrentar frio, chuva, morro... mas cada bater de asas, cada voo com aquela aerodinâmica única, cada passinho na grama e cada levantar e abaixar de pescoço nos recompensava imensamente. Amo esse nossa família perfeita! Próóóó!!!!