Eu sabia que meus conhecimentos de croata estavam muito aquém do necessário para manter uma verdadeira conversação nesta língua. Ao mesmo tempo, porém, estava ansioso para testar o quanto eu seria capaz de me valer dela.
No avião, agarrei o jornal local e me pus a decifrar as notícias naquela língua que eu só conhecia de longe – empenhara-me em aprender croata nos últimos meses, mas eu não sabia se um livro e umas gravações do tipo “estude por conta própria” seriam confiáveis. Nunca tinha tido uma conversa em croata. Então, quando passou a aeromoça perguntando o que eu iria querer beber, caprichei na pronúncia: “ja bih sok, molim vas” (quero um suco, por favor). Juro que me espantei com a naturalidade com que ela replicou – “jabuke ili naranče?” Eu havia conseguido me comunicar! Não tinha me ocorrido que teria de dar mais uma resposta – qual suco eu queria, maçã ou laranja? Mas aí não tive dúvida, suco de laranja é dos meus preferidos e a palavra em croata é facilmente reconhecível.
Em solo, fui descobrindo que eu estava até acima das expectativas. Sim, falta-me vocabulário e falta-me sobretudo fluência: não consigo pensar em croata, as frases levam um ano até se formarem na minha cabeça. Mas entendo bastante coisa. A gramática é complicada, mas a fala é surpreendentemente familiar, os croatas em geral pronunciam cada letra de maneira bem clara, facilitando o entendimento (só não esperem isso de uma dona de casa elétrica, daquelas que engolem as sílabas em qualquer parte do mundo).
Uma cena comum, ao menos em algumas cidades da Croácia, são banquinhas na rua em que se vendem saquinhos com lavanda. Eu não estava morrendo de vontade de comprar um saquinho de lavanda, mas queria vivenciar o pitoresco da cena: as mesinhas cheias de saquinhos e de essências, atrás de cada mesa um banquinho com um senhor ou senhora esperando possíveis compradores. Aproximei-me, então, e a velhinha daquela banca começou a me apontar os produtos, tateando o inglês e ansiosa por vender. Eu devia ter toda a pinta de um turista estrangeiro. Quando, porém, a mulher viu que eu estava falando (ou tentando falar) a sua língua, foi como se algo se iluminasse, ela abriu um sorriso e desandou a conversar comigo, a contar coisas de si e da cidade... Eu entendia, quando muito, metade do que ela dizia, mas estava fascinado pela situação! No final, claro, comprei um saquinho (pequeno, mas suficiente para deixá-la contente) e arrisquei pedir-lhe uma foto. Ela respondeu: não tem problema, mas para que foto, eu sou tão feia!
Ora, nunca é feia a pessoa que nos faz sorrir, ó senhorinha a quem eu infelizmente esqueci de perguntar o nome!
Deixei a Croácia de barco (modo fácil e cômodo de atravessar o norte do Adriático) numa manhã de céu claro. Era bem cedo. Quis comer alguma coisa e fui até a lancheria de bordo. Eu sabia que aquela tripulação falava inglês e italiano (idiomas mais familiares para mim) e que possivelmente não eram croatas. Mesmo assim, ao escolher um sanduíche e algo para beber, fiz questão de falar em croata. Uma forma de praticar ainda uma vez esta língua da qual já sinto saudades. E uma despedida singela daquela terra e daquelas pessoas a que me afeiçoei.