sábado, 7 de abril de 2018

Muito além do kimchi: comida na Coreia

É tentadora a imagem de que a Coreia do Norte e a do Sul são "dois irmãos brigados". Porém, embora razoável até certo ponto, ela me parece uma simplificação perigosa. Eu não diria que há exatamente uma briga entre os coreanos do norte e do sul; em vez disso, o clima lá me pareceu mais de desconfiança, isso sim; de dois irmãos que, por circunstâncias da vida, ficaram anos sem se falar e agora não sabem mais como puxar assunto numa conversa.
Mas o fato é que, apesar disso e dos que dizem o contrário, têm o mesmo sangue e a mesma criação: compartilham a língua, a história, a paisagem, o clima, o tipo de comida. O que nos leva a esse assunto: o que comemos por lá. Confesso que minha expectativa com a comida coreana era bastante baixa: as descrições de pratos que eu achava na Internet não chamavam a atenção e a minha experiência anterior com comida na vizinha China, muito menos.
Acabei me surpreendendo enormemente, a tal ponto que voltei para o Brasil com saudade da comida de lá e voltaria feliz a qualquer um dos restaurantes que visitamos.
Verdade que na Coreia do Sul, a princípio, foi difícil encontrar o caminho das pedras - dos pratos, no caso. A oferta é muita, variada e numa língua pouco amigável. Mas, à medida que ia me familiarizando, descobria que a comida coreana não era nenhum bicho de sete cabeças. Havia opções para praticamente todos os gostos, era em geral menos apimentada que o previsto e, sempre, muito saborosa. De quebra, descobrimos em Seul alguns restaurantes no estilo bufê livre. Uma maneira excelente para provar de uma vez várias das possibilidades da cozinha coreana! De fato, em pelo menos uma ocasião saímos do restaurante rolando de tão cheios.
Kimchi (espécie de acelga em conserva) é onipresente, mas é mais um acompanhamento que um prato propriamente dito. Sopas são comuns. As panquecas coreanas, em suas diferentes variações, são deliciosas. Massas são abundantes e de todos os tipos, não só de trigo. Chás acompanham a maioria das refeições, mas também são feitos de cereais variados e só raramente encontramos um sabor igual aos que estamos acostumados.
Na Coreia do Norte, curiosamente, a alimentação foi bem mais simples. Primeiro porque, já tendo passado por um "estágio" do sul, sabíamos um pouco melhor o que esperar. E principalmente porque nossas guias não mediam esforços para nos proporcionar experiências fantásticas. Em cada uma das nossas refeições norte-coreanas, uma coisa era certa: a quantidade de comida era sempre demasiada. A comida vem à mesa em pequenas vasilhas, cada uma com um preparo; quando se vê, a mesa está cheia de potinhos cada um com com arroz, sopa, kimchi, repolho, ovos, massa, carne, panqueca, tofu ou alguma outra coisa... Às vezes é difícil adivinhar a sequência ou a quantidade de pratos. Mais de uma vez nos saciamos apenas com a entrada, sem saber que outros tantos pratos ainda estavam por vir...
No final das contas, as refeições menos memoráveis foram as que fizemos no restaurante de algum hotel: estas tendiam a ser servidas num ambiente mais nobre, mas ficavam devendo um pouco do sabor e da variedade dos lugares mais simples. Por outro lado, uma dúvida que eu sempre tinha era: o quão parecido estas refeições seriam da comida norte-coreana do dia-a-dia. Meu palpite é que o grau de semelhança é tanto quanto o de um restaurante brasileiro com a nossa comida caseira: um almoço comum no Brasil dificilmente será tão variado ou tão bem apresentado quanto o de um restaurante (digamos, uma churrascaria), mas a ideia dos pratos possíveis em casa é a mesma dos que poderíamos encontrar na rua. O mesmo acho que vale para uma refeição típica de Pyongyang e algumas das comidas que provamos por lá.
Um bônus adicional desses momentos era que se tratava de ocasiões em que conversávamos e interagíamos mais à vontade com nossas guias e nosso motorista. Uma experiência que não tem preço!
Quanto aos pratos propriamente ditos... Eram tantos e tão diferentes que é difícil deter-se explicando todos. Talvez um dos mais emblemáticos, tanto no sul quanto no norte, seja o bibimbap: arroz com legumes, tempero e eventualmente um ovo. A particularidade é que a comida vem toda separada num grande prato e cabe à própria pessoa misturar todos os ingredientes. Aliás, parece que esse tipo de solução, que requer algum "preparo" à mesa, é bastante comum. Outro exemplo é um tipo de hot pot coreano, uma sopa em que os ingredientes todos são cozidos na nossa frente. Para fazer um assado, a mesma coisa: a carne chega crua à mesa e é assada numa grelha ali mesmo. Aliás, esses restaurantes nos proporcionaram risadas impagáveis: certo dia, Lee, a guia, anunciou que o almoço seria num restaurante especializado em frango - chicken. Como a Renata é vegetariana, Lee logo completou: e baby chicken. Por baby chicken, entenda-se ovo de galinha... Não houve como não rir. Noutro dia, haveria pato assado (duck) no jantar; para ela, baby duck...
Outro prato surpreendente é o naengmyeon, que dizem ser típico de Pyongyang. Em inglês: cold noodles. Bem, poucas coisas parecem menos animadoras que um prato de espaguete frio; mas a receita coreana superou todas as minhas expectativas e se mostrou bastante apetitosa, mesmo para um dia de inverno. É uma sopa com uma massa fina e comprida e diferentes vegetais, com um tempero levemente ácido e apimentado. É, como outras, uma comida finalizada pela própria pessoa imediatamente antes de comer, que se encarrega de temperar e misturar os ingredientes no prato.
Pode ser difícil de acreditar, mas não tem como não ficar com água na boca falando disso tudo!




Um comentário:

Renata Teixeira disse...

A comida coreana é maravilhosa! Como passamos bem nessa viagem! Como não explodimos de tanto comer? E como não voltamos pesando arrobas a mais, eu também não posso explicar. Depois da sofrência na viagem à China, eu voltei à Ásia certa de que passaria perrengue novamente. E para a minha surpresa aconteceu o oposto. Desde nossos jantares de saborosos morangos no Tommy, passando pelos maravilhosos restaurantes de Seul, pelas refeições com o Mark, a Sophy e a Jihey, até as refeições na Coreia do Norte – cada uma mais gostosa que a outra! Foi mais uma das incontáveis surpresas agradabilíssimas dessa viagem. Posso dizer de todo coração: eu amo comida coreana!