A atual República da Macedônia é um país de história bem peculiar, história essa se reflete na sua cultura, arquitetura, política e modo de vida. Assim como acontece com o Kosovo, é preciso uma certa dose de pensamento não-linear para entender os acontecimentos que levaram a Macedônia a ter a cara que tem hoje.
Para começar, algo básico: o nome. Parece uma questão simples, mas o nome “Macedônia” é objeto de uma disputa ardente entre políticos da própria República da Macedônia e da Grécia, que também possui uma região interna homônima. Os gregos bateram (e ainda batem) tão firme nesta tecla que, ao ganhar independência, o país só foi aceito internacionalmente com o nome de Antiga República Iugoslava da Macedônia – como quem diz, cheio de dedos: “olha, eu me chamo Macedônia, mas isso não quer dizer necessariamente que sou a mesma Macedônia dos gregos ou aquela Macedônia de Alexandre, o Grande, que vocês conhecem”.
No século XIX, o território do que hoje é o país era literalmente disputado por todos os seus vizinhos – sérvios, búlgaros, gregos e albaneses. Já os macedônios propriamente ditos, que viviam ali, era um povo que ninguém sabe dizer exatamente como surgiu: todas as versões são influenciadas por um viés político bem forte. Mas, basicamente, os macedônios são um povo eslavo que habitava uma região periférica de fronteira entre antigos impérios. Tinham similaridades com outros eslavos de religião ortodoxa (búlgaros, sérvios e gregos), mas desenvolveram uma identidade própria. Ao final da Primeira Guerra Mundial, a Macedônia passou a fazer parte da Iugoslávia; separou-se em 1991 – naquela época de guerras nos Bálcãs, foi a única das ex-repúblicas iugoslavas a conseguir independência de forma pacífica. Desde então tenta se firmar, apesar da desconfiança da Grécia e da Bulgária e do fluxo de refugiados albaneses que entraram no país durante a Guerra do Kosovo.
Como parte da estratégia para se firmar como nação, foi adotada uma política de identificação do atual país com o antigo Reino da Macedônia através de símbolos como a bandeira, as cores e a própria figura de Alexandre, o Grande. Acontece que a Macedônia antiga era uma região maior e ainda menos homogênea que chegou a englobar bons pedaços das atuais Grécia, Bulgária e Turquia, além da Macedônia propriamente dita. Daí parte da implicância dos vizinhos com o uso do nome e destes outros símbolos. Temem, entre outras coisas, futuras demandas de território.
Bem, e como isso tudo se reflete no dia-a-dia? Definitivamente não dá para generalizar dizendo que uma pessoa comum na Macedônia odeia os gregos ou coisa do tipo. Assim como o nome do país é só um nome e não faz muita diferença na hora em que cada um vive sua vida. Mas a dificuldade de integração internacional (o país tenta há anos ser aceito na União Europeia e na OTAN, por exemplo, mas conta com veemente oposição grega) tem, sim, consequências econômicas. E há o fator dos albaneses, que formam uma “grande minoria” e protagonizam disputas políticas com os eslavos. Em certos momentos, isso fica bem evidente, como, por exemplo, no dia em que resolvemos assistir a uma partida de futebol pelo campeonato local no belo estádio da capital. O jogo era entre Vardar, o maior time do país e identificado com a etnia macedônia, e o Shkëndija, equipe de fortíssima identificação com a etnia albanesa. Em função da rivalidade, foi um jogo de torcida única: para evitar conflitos, os simpatizantes do Shkëndija estão proibidos de assistir a jogos na capital. Em volta do estádio, forte policiamento militar. Dentro, os dois times (primeiro e segundo colocados no campeonato) fizeram uma bela partida diante de arquibancadas quase desertas. É uma pena que nem todas as diferenças possam ser resolvidas pelo esporte.