Explorar uma nova cidade é como preencher uma página em branco. Dá medo. Às vezes não sabemos por onde começar. E a cidade tem o agravante de não permitir borracha nem rasuras: raras vezes se consegue corrigir falsas primeiras impressões.
Ter um mapa ou guia debaixo do braço ajuda. Um livro lido na semana ou no dia anterior, mais ainda. Mas nada substitui o esquadrinhar das ruas que fazemos com nossos próprios passos. E é aí, no instante em que colocamos o pé na calçada, que surge a primeira hesitação: para lá ou para cá? Esta ou aquela rua? Apela-se para a sugestão de algum conhecido ou do recepcionista do hotel, apela-se para a intuição ou para algum pressentimento, mas é preciso apelar. Não é fácil ser um flâneur, como dizem os franceses.
Mas é preciso, e tão impreciso quanto viver não é preciso.
Sigo meus palpites. Às vezes, sim, apelo. Procuro ter na cabeça uma ideia geral da cidade ou do bairro por onde ando mas, isso posto, não me preocupo com me perder: ignorar momentaneamente o nome da rua por onde passo não vai me causar problema algum. E pode trazer surpresas.
Creio que é por isso que gosto tanto de explorar cidades pequenas. Delas, não sabemos exatamente o que esperar. Hoje em dia, todo mundo já foi a
Paris e tem profusão de dicas imperdíveis sobre a cidade, mas quem conhece a
Vila do Corvo? Nas cidades pequenas, todos os caminhos são válidos, todas as ruelas parecem nos esperar de braços abertos. Nas grandes metrópoles, a sensação de estar perdendo algo anda sempre à espreita, e alguém nos dirá, na volta:
o quê, vocês foram a Paris e não subiram na Torre Eiffel? Ou pior ainda:
mas eu avisei que aquele restaurante numa ruela desconhecida do Quartier Latin era imperdível, se vocês não foram até lá, voltaram sem saber nada de gastronomia francesa!
Dispenso os conselhos agourentos. Vou a
YangShuo, na província chinesa de GuangXi, ninguém vai me dizer o que devo fazer por lá e poderei me perder à vontade. Principalmente com as placas todas escritas em chinês.
Claro, as cidades grandes também valem a visita, não há como dispensá-las. Nestes casos, a estratégia é diferente, não basta flanar. Sou um sujeito curioso e ansioso, o que significa que já terei de antemão uma lista dos pontos que não quero deixar de conhecer: um Corcovado aqui, uma Torre Eiffel ali, um
Taj Mahal acolá. O primeiro dia será dedicado a explorar avidamente as tais atrações imperdíveis (que não coincidem necessariamente com as atrações imperdíveis dos guias de viagens). Mas o segundo dia, e talvez outros mais, deverá ter um tempo generoso dedicado a caminhar por aí, sentir o clima e o som da cidade, descobrir lojinhas e livrarias, ousar petiscos. Que graça teria uma viagem se já soubéssemos de antemão tudo o que nos espera?