sexta-feira, 24 de junho de 2016

E então nos casamos!

No fundo, quando pensávamos em como seria o domingo 19 de junho de 2016, o que vinha à cabeça era algo relativamente simples. Por mais que houvéssemos planejado e sonhado com esse dia, sabíamos que teríamos pouquíssimos convidados (por uma escolha nossa, já que, sendo de dois diferentes estados e morando num terceiro, havíamos escolhido não privilegiar nenhum destes lugares e fazer uma cerimônia à nossa maneira). E, até o dia se aproximar, não sabíamos nem como seria exatamente a recepção destas mesmas pessoas.
Quando amanheceu o domingo, nossas últimas horas de solteiro voaram. Às 11 h, a moça que se oferecera para arrumar a noiva chegou para pegá-la. (Não é tão fácil reservar uma cabeleireira para o domingo nas Ilhas Faroe estando do outro lado do oceano, tanto que cheguei a treinar fazer algumas tranças na Renata, caso fosse preciso eu ajudá-la, e ela mesmo se maquiaria. Mas Vígdis, a filha dos donos da casa em que nos hospedamos, ofereceu-se e acabou fazendo um trabalho magnífico.) Eu fiquei sozinho para me arrumar, vestindo com cuidado cada uma das peças da roupa nacional faroesa que Mirjam nos havia preparado.
Uma meia hora antes das duas da tarde, Tróndur estava esperando do lado de fora da casa, pronto para me levar à igreja em seu carro novíssimo (um de seus orgulhos). Chegamos antes de todo mundo. Na igreja vazia, confesso que eu estava bastante nervoso. Dali a pouco, veio o senhor responsável por abrir as portas e acender as velas. Cumprimentou-me e paramos os três na frente da igreja, que fica em posição elevada, olhando para a rua. O senhor começou a tocar os sinos da igreja e foi incrível, como num sonho ou num conto de fadas. Quase no mesmo instante avistamos os carros subindo a rua, chegaram todos ao mesmo tempo - o padre, os convidados, e Renata, a noiva mais linda que já existiu. Seguindo a tradição faroesa, entramos juntos na igreja (que então já estava bem mais cheia do que poderíamos ter imaginado) pontualmente às duas horas, no exato instante em que os sinos pararam de badalar e o órgão centenário encheu a igreja de Tvøroyri com as notas da marcha nupcial. O padre nos recebeu no altar e conduziu toda a cerimônia em inglês, dava para ver o quanto ele mesmo estava nervoso e feliz pelo momento, certamente depois de ter passado a noite treinando em inglês as palavras que está acostumado a falar em sua língua. Quando convidou os presentes a cantar em feroês, tomou antes o cuidado de nos explicar de que falava cada uma das canções. No pequeno sermão, falou de como a Renata e eu nos conhecemos, e não poderia ter sido mais emocionante.
E veio o momento em que nos aproximamos, recebemos a benção, dissemos o "sim" mais especial de nossas vidas e trocamos alianças. Então nós dois, que estávamos em bancos separados na frente da igreja, sentamos juntos, para não nos separarmos mais. E assim foi de mãos dadas que cruzamos novamente a nave, ao som do órgão que tocava a marcha de Mendelssohn, caminhando lado a lado rumo à vida inteira que temos pela frente e que juramos escrever juntos, capítulo a capítulo, para fazer de nossa história uma linda história de amor, tão linda quanto o sorriso que reluzias naquele domingo. Te amo, Renata, minha esposa para sempre.

domingo, 19 de junho de 2016

Coisas que acontecem numa ilha distante

O melhor da vida são os encontros. O melhor das viagens, provavelmente, também.
A vida me ofereceu o encontro com a Renata, minha querida companheira, amiga, parceira, amada, namorada e noiva... Mas noiva apenas por mais algumas horas, já que hoje mesmo estaremos entrando na igreja para formalizar tudo o que sentimos um pelo outro e queremos viver juntos. Uma grande responsabilidade e, sobretudo, uma grande felicidade.
Quisemos que este momento fosse especial de todas as formas possíveis, inclusive no lugar escolhido. Antes do inevitável impasse - onde fazer a cerimônia, no Rio, no RS, em MG? - surgiu a semente da ideia de fazer num lugar que fosse bonito e especial para ambos. Incertos da resposta, procuramos contato com o padre, que foi mais que amável em nos acolher. E assim estamos agora em Suðuroy, a ilha que tem provavelmente as pessoas mais amáveis do planeta, prestes a nos casarmos!
O lugar é tão encantador que sua beleza não cabe nas fotos e torna pequenos os melhores superlativos. E as pessoas... Quando chegamos, Tróndur estava lá, sorrindo para nós, de camisa canarinho do Brasil e calça azul (ele de mangas curtas e nós de casaco nos 10 graus do fim de tarde). Levou-nos até o endereço em que ficaríamos hospedados. Lá, sem que esperássemos, o casal dono da casa já havia estacionado um carro para deixar à nossa disposição e foi logo estendendo a chave e falando de um ou outro macete para ligar o carro e passar as marchas.
Tróndur nos mostrou a cidade, levou-nos para jantar, para pescar, abraçou uma grande bandeira do Brasil saída não sei de onde e pediu licença para hasteá-la cerimonialmente hoje.
Jónsvein, o padre, um homem simples que é só sorriso, fez um pequeno treino da cerimônia, que será bilíngue. Mostrou-nos a igreja, contando sua história e a origem de cada peça da decoração.
O irmão de Tróndur, ex-futebolista como ele, apresentou-nos sua casa, onde cultiva um jardim de sonho, pinta quadros e guarda um verdadeiro museu de relíquias, com camisas de times de futebol, troféus, fotos, discos, antigas ferramentas de trabalho do pai e do avô...
Depois, visitamos Einar, que conversou, contou histórias do seu passado de pescador no Atlântico Norte, apresentou-nos sua filha que mora na casa em frente, convidou-nos para um café e chocolates.
Mais tarde, fomos visitados por um repórter do maior jornal das Ilhas que queria nos entrevistar e perguntou se podia ir à igreja tirar algumas fotos da cerimônia. (Todos pedem licença para assistir ao nosso casamento, como se fossem eles os intrusos e não nós.) Ao mesmo tempo, a dona da casa veio nos apresentar sua filha, que se ofereceu para arrumar cabelo e maquiagem de minha noiva, ajudá-la com o vestido e levá-la até igreja. Nisso tudo, quando percebemos, havia sete pessoas (e um puffin) na casa, conversando, contando histórias, rindo. Sim, a vida (como as melhores viagens) é feita de encontros. Havia chance de eu não amar a mulher que vive, sente e pensa tudo isso da mesma forma que eu?

domingo, 5 de junho de 2016

Um livro para viajar e a cidade de Bratislava

Foto: Eduardo Trindade
"A máquina de xadrez", do alemão Robert Löhr, é um livro que eu recomendo. Trata-se de um romance engenhoso, ambientado no século XVIII, que reúne várias das características que me atraem num livro, como o fundo histórico e a narrativa ágil e levemente misteriosa, que prende a gente até a última página. Eu gostaria de falar um pouco mais do livro, mas é difícil fazer isso sem dar com a língua no dentes, então me limito a copiar um pequeno trecho da contracapa: "No século XVIII, o barão Wolfgang von Kempelen encantou o continente europeu com a máquina de xadrez. Um autômato vestido de turco desafiava qualquer humano para uma invencível partida." Isso é estritamente real, está nos anais da história, como vocês podem conferir se tiverem curiosidade. E, a partir desse ponto, o autor escreveu seu livro.
A história se passa em Pressburg - e é aí que ela começa a sair das folhas do livro e da realidade histórica para a nossa realidade. Pressburg é o antigo nome de Bratislava, a atual capital da Eslováquia. A cidade é descrita pelo autor e, mais do que naturalmente, acabou absorvendo parte do meu interesse pelo próprio livro. Acontece: bons livros levam a gente a querer saber mais sobre seus personagens, lugares e segredos! Com "A máquina de xadrez", não foi diferente: demorou um pouco, mas acabei pisando em Bratislava.
Foto: Eduardo Trindade
Que é relativamente pequena para ser capital de um país, mas tem charme de sobra. Bratislava é um típico exemplo de uma cidade nobre do velho império austro-húngaro, tendo assim certos ares em comum com Viena, Praga e Budapeste, mas duma forma, digamos, mais intimista. O rio Danúbio está lá, tocando o centro histórico, que é compacto e muitíssimo bem conservado. Os restaurantes estão por todos os lados. E o que talvez mais chame a atenção são as estátuas bem-humoradas que se espalham por diversos pontos do centro. Estão ali como se quisessem piscar para a gente. Não longe delas, tivemos o privilégio de alugar um pequeno e confortável apartamento - o que acaba sendo mais gostoso do que ficar hospedado num hotel. Quase como se habitássemos as páginas de um livro.

Duas das estátuas de Bratislava