segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

Na estrada, nas Ilhas Faroe

Fugindo um pouco do habitual, a postagem de hoje é em forma de vídeo - tentativa de registrar nosso passeio pelos belos e surpreendentes caminhos das Ilhas Faroe.

terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

A viagem do Puffin

Ao planejar as férias, uma das primeiras coisas que procurei saber foi se seria possível, nessa época do ano, ver algum puffin (papagaio-do-mar em português, lundi em islandês e em feroês), a simpática ave símbolo das ilhas do norte. Já a conhecia do Oceanário de Lisboa, mas vê-la por aqui seria outra coisa... Disseram-me que não, que a essa altura, inverno, os puffins estariam todos longe e só voltariam na próxima temporada.
Mas acabamos vendo e trazendo o Puffin da foto. Ele é uma criança meio tagarela e comilona, divertidíssima. Tem tudo a ver com a cara da viagem e ficou simplesmente encantado quando percorreu conosco, de carro, três das 18 Ilhas Faroe. Maravilhou-se tanto quanto a gente com a paisagem dessas ilhas, com os túneis gigantescos por baixo do mar que ligam uma à outra, com as ovelhas nas encostas das montanhas, com poder cumprimentar cada pessoa que passa com um sorriso e um aceno - e ser correspondido. Balançou as asinhas ao som de Teitur, o astro musical das Ilhas Faroe. Embora a sua praia seja peixe, o Puffin também adorou o espesso e saboroso iogurte de laranja feroês.
Depois, viemos para as cidades grandes do continente e ele nos fez prometer que voltaríamos às Faroe no verão para conhecer os outros puffins. Disse que nos ensinaria mais palavras em feroês e nos levaria às ilhas mais distantes. Bem... Nem precisaria pedir duas vezes.

domingo, 10 de fevereiro de 2013

Quando o peixe não é fresco

Esqueçam o conceito de que a China, com seus espetinhos de baratas, aranhas e lacraias, teria a comida mais exótica do planeta.
E vocês sabem aquelas dicas que todo mundo já ouviu alguma vez na vida sobre como escolher peixe, como saber se o peixe do mercado está fresco? Esqueçam isso também.
Ao que tudo indica, os islandeses são um povo que passou muita fome. Hoje, nem tanto mais (é impressionante ver como cultivam vegetais em estufas totalmente aquecidas enquanto lá fora não há sol e a temperatura é congelante). Mas fato é que, do passado de dificuldades, dizem ter guardado algumas "saborosas" receitas: cabeça de bode (inteira), pudim de sangue de ovelha ou testículos de bode cozidos em leite azedo. Tudo isso faz parte do Þorramatur, um "mistão" servido tradicionalmente no mês de fevereiro.
Mas ainda não é nada comparado com outra especialidade islandesa, o hákarl. O que nos leva de volta à inutilidade dos métodos de se determinar se um peixe é fresco ou não; pois hákarl é simplesmente peixe podre, em toda a extensão de significado (e cheiro, e sabor) que a expressão "peixe podre" pode abranger.
Pega-se carne de tubarão; coloca-se a carne para fermentar (literalmente, apodrecer) durante dois ou três meses; deixa-se secando ao relento por mais um meio ano; pica-se o resultado disso em cubinhos, coloca-se em potes e a mais inesquecível experiência islandesa está no ponto para ser vendida em supermercados.
Comprei um potinho de hákarl. Não tive coragem de consumi-lo de imediato. Todas as descrições que eu tinha encontrado eram altamente desencorajadoras. A aparência é de cubinhos com uma gosma escorrendo. E o pote estava estufado (outro conselho inútil: o de que embalagens estufadas indicam alimentos que passaram do ponto).
Só fui abrir o pote dois dias depois, numa aldeia a quilômetros de qualquer centro urbano. E... Minha nossa! Imaginem um cheiro forte de peixe misturado a um cheiro mais forte ainda de amônia e de urina. De dar náuseas, literalmente. A mais nojenta de todas as coisas nojentas que já vi sendo oferecidas como alimento. A impressão é de que aquilo empestearia qualquer ambiente. Aliás, só de abrir o pote, eu mesmo fiquei com o cheiro impregnado no corpo a ponto de precisar apelar para um vidro de perfume que disfarçasse um pouco o fedor. Comer aquilo? Desculpem, não havia a menor possibilidade e não imagino como alguém pode conseguir (eu tinha perguntado ao caixa do supermercado se ele gostava e a resposta fora afirmativa, mas que mesmo ele não conseguia comer mais de três cubinhos por causa do "sabor muito forte").
Com aquele pote aberto, não pude pensar em outra coisa que não fosse procurar uma lixeira. Enquanto me desfazia do hákarl (não, não dá para imaginar aquilo como comida), eu ia juntando as ideias: lembrei que uma particularidade da Islândia é ser um dos poucos países do mundo que não têm exército. Também, pudera: sabendo que eles dispõem de uma arma de destruição em massa como essa, quem se atreveria a ameaçá-los?

sábado, 9 de fevereiro de 2013

Ilhas Faroe

Hoje, nas Ilhas Faroe, dei-me conta de um conceito interessante: a diferença entre países que têm lugares bonitos e países que são bonitos.
As Faroe são um arquipélago de 18 ilhas próximas umas das outras, entre a Islândia e a Grã-Bretanha. Trata-se de um território semi-independente ligado ao Reino da Dinamarca (mas tem bandeira, língua, moeda e seleção de futebol próprias). E, sobretudo, as Ilhas Faroe são um lugar lindo por inteiro.
Entre ontem e hoje, percorremos as duas principais ilhas do arquipélago (além da terceira, onde fica o aeroporto). E perdi a conta das exclamações com a paisagem que surgia depois de cada curva: fiordes, picos nevados, cidades minúsculas e encantadoras. Vilarejos de 80, 50 ou 30 habitantes cada, com casas de pedra e telhados de grama - sim, plantam grama nos telhados, o que é uma forma de regular a temperatura no interior, além de deixar a cidade linda. Cada pessoa que surge nos cumprimenta com um sorriso incrivelmente cativante. Crianças acenam. Muitos em Tórshavn, a capital, sabem inglês. Já num vilarejo, um senhor sorridente nos faz uma longa e incompreensível pergunta em faroês; sorrio de volta e digo que somos do Brasil, ele parece ainda mais sorridente depois da resposta inusitada - turistas são raros por aqui, ainda mais sul-americanos.
Sei que ficamos cativados perdidamente por esse lugar lindo, de gente simples e bem-educada. Procuro colecionar memórias, fotos e suvenires. Já antevejo a saudade da hora da partida!

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

Os Caçadores da Aurora Boreal

Sendo um dos países mais setentrionais do planeta, a Islândia é tida entre os melhores lugares para se ver a Aurora Boreal, uma dança de cores que ocorre no céu nas noites de inverno devido a um fenômeno físico e geográfico. Ir à Islândia e não ver a Aurora Boreal é como, com o perdão da frase-feita, ir a Roma e não ver o Papa.
Estivemos num dos melhores lugares da Islândia para se ver a Aurora Boreal: a ilha de Grímsey, no Círculo Polar e a bons quilômetros de qualquer grande centro urbano. Infelizmente, o tempo estava bastante fechado e, quando não se consegue ver o céu além das nuvens, também não se consegue ver a Aurora.
Voltamos a Reykjavík (Reiquejavique), a capital. Lá, a Aurora Boreal é um negócio com excursões organizadas que não chegam a prometer o espetáculo de luzes mas oferecem ingresso grátis na noite seguinte caso a saída não tenha sucesso.
Nas primeiras noites, o céu estava tão fechado que sequer tentamos (acho mesmo que nenhum "Northern Lights Tour" saiu). Na noite passada, a perspectiva estava mais promissora - céu querendo abrir durante o dia e "Aurora Forecast", a previsão de Aurora Boreal, otimista.
Pegamos então um ônibus de excursão que, às 21h, nos levou a uns 40 quilômetros fora da cidade e parou à beira da estrada no meio do nada. Nada mesmo, nenhuma luz, apenas vento e a temperatura congelante. Descemos do ônibus e ficamos olhando para o céu. Negrume total. Lembrei-me de quando era bem criança e do cometa Halley - a decepção de não ver nele motivo para a empolgação dos adultos.
Então, uma meia hora depois, sem que tivéssemos avistado a Aurora Boreal, o ônibus resolve ir para um lugar mais longe. E mais frio. Minhas pernas congelam, meus dedos também. O nariz, nem se fala. Dizem que fotografias captam a Aurora melhor que o olho humano, então aponto minha câmera a esmo para o céu, em vão. Vou me sentindo cada vez mais bobo.
Enquanto uns seguem esperançosos à beira da estrada, outros desistem e entram no ônibus estacionado. Entro também - pelo menos é mais quentinho e, se a Aurora resolver aparecer, certamente terei tempo de sair para ver. Mas nada. Cochilo. Aos poucos, já não quero outra coisa senão voltar para a cidade. Surgem as brincadeiras:
- Vou oferecer mil coroas para um piá passar apontando uma luz verde com uma lanterna e acabar com essa palhaçada...
- Aurora Boreal? Isso é conto-do-vigário islandês...
- Os islandeses acreditam em duendes, trolls, fantasmas... E na Aurora Boreal. Como é que fomos acreditar nisso também?
Pelo menos demos boas risadas que ajudaram a passar o tempo. Era mais de meia-noite quando a expedição assumiu o fracasso e o ônibus resolveu retornar à cidade. Já era praticamente uma hora da manhã quando reencontrei minha cama. No dia seguinte, fui embora da Islândia sem ver a Aurora.
Mas, pensando bem, também não vi o Papa quando estive em Roma.

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

Lagoa Azul

Existem por aí uma porção de lugares conhecidos como "Lagoa Azul". Nem todos são lagoas, alguns sequer são lá muito azuis, o fato é que estão por aí. Pudera, o nome impressiona e pegou mesmo, principalmente depois de umas tantas reprises do filme.
Acontece que não sei de lugar algum que mereça tanto o título de "Lagoa Azul" quanto a que existe na Islândia.
De ônibus, vai-se de Reiquejavique até um ponto 40 quilômetros no meio do nada. "Nada" é algo que há em abundância por aqui - refiro-me a uma paisagem de gelo, pedras vulcânicas e montanhas baixas, sem gente ou árvores. Então, num lugar assim, vê-se literalmente um prédio entre brumas. São as instalações da Lagoa Azul. O prédio tem chuveiros e um restaurante, a lagoa propriamente dita está em volta e é ela que exala a bruma: vapores de água subterrânea a quase 40 graus e rica em sais, principalmente enxofre. Muito enxofre em suas diversas formas, o cheiro não deixa enganar. A cor também é característica da mistura de sais que sai da terra: um azul-celeste cúpreo é a cor da lagoa, uma cor tão intensa, um ambiente tão turvo e fumacento que mesmo onde a profundidade é de menos de meio metro não se pode sequer imaginar o fundo de pedras escuras.
Por si só, isso já é um espetáculo louco e difícil de escrever (minha foto definitivamente não faz justiça ao lugar). Agora o mais louco de tudo é: as pessoas vão até lá para se banharem na lagoa! Num clima subzérico!
Os poucos metros que se caminha de roupa de banho entre a saída do prédio e a borda da lagoa são apavorantes. Depois, dentro dela, a sensação é reconfortante, exceto pelo vento frio a fustigar a cabeça. O segredo é submergir ao máximo, apenas boca e nariz fora d'água!
E então nadar, espantando-se sempre com a cor da água e com a paisagem de ficção-científica em volta. Isso sim é uma lagoa azul. Daquelas que, se a gente depois contar que viu, ninguém vai acreditar lá em casa.

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

Os Amantes do Círculo Polar

"Os Amantes do Círculo Polar" é um nome de um filme que há 10 anos me recomendam e que eu ainda não vi... Este texto de agora não tem nada a ver com o filme, mas tem tudo a ver com o título.
Fomos até Akureyri, norte da Islândia. Lá, às 8h da manhã (noite fechada), tomamos um ônibus até a vila de Dalvik a tempo de subir no barco que faz a travessia para Grímsey. O marinheiro que nos recebeu ainda avisou: o mar não estava nada amigável, com onda de quatro metros. Ele estava seguro de que passaríamos mal na viagem. Resolvemos assumir o risco.
Três longas horas de travessia depois, desembarcamos em Grímsey. Trata-se de uma minúscula ilha, o ponto mais setentrional da Islândia, onde a população fixa é de 70 habitantes. Um pequeno (e belo) pedregulho no meio do mar, salpicado de neve e de algumas poucas casas.
E mais, para quem gosta de símbolos ou de geografia: o Círculo Polar Ártico corta a ilha ao meio. Cruzamos o Círculo Polar!
Passamos a noite em Grímsey; no primeiro dia, exploramos a parte sul da ilha e, no segundo dia, a parte norte (o Ártico). Tudo a pé.
As paisagens são magníficas, com escarpas de filme lotadas da gaivotas por todos os lados. Pena que, nessa época do ano, não se vê o puffin ou papagaio-do-mar - simpática ave símbolo da Islândia. Pena, também, que o tempo nublado não nos permitiu ver a Aurora Boreal.
Mas, como não poderia deixar de ser, o simples fato de se estar num lugar tão remoto é uma atração à parte. A risonha mulher que nos recebeu (de mangas arregaçadas ao vento enquanto eu me arrependia de não ter mais casacos) mostrava sua terra com bastante bom-humor. Ali o mercado (abre das 15h às 18h), lá o "barulhento" gerador elétrico (o que para ela era barulhento passaria despercebido na menor das nossas cidades), acolá a "floresta" de Grímsey - meia dúzia de arbustos de não mais de 30 cm, as "árvores" mais altas da ilha. Quase na hora de irmos embora, ela me convidou a visitar a escola da ilha e eu demorei a entender o que ela dizia - não é sempre que um "turista" recebe convite para conhecer uma escola. Fomos. Que surpresa encantadora! Não só vimos o espaço onde as crianças estudavam, liam e brincavam. Fomos logo cercados por uma dúzia de loiríssimos piás, alguns tímidos e todos curiosos. Fiquei com pena de não saber mais palavras na língua deles, mas todos falavam algo de inglês! Um trouxe um globo terrestre e pediu que eu apontasse de onde tínhamos vindo. Outro, ao ouvir "Rio de Janeiro, Brasil", lembrou logo que tínhamos lá um "big guy" - o Cristo Redentor. Outro, ainda, lembrou de um parente em Belo Horizonte!
E assim foi nossa curta visita não apenas ao Círculo Polar, mas àquela gente que ama o Círculo Polar para lá viver com tanto orgulho e tanta alegria. Na partida, a mesma mulher responsável pela pousada onde ficamos foi (literalmente) abrir o aeroporto para a chegada do nosso avião - um voo que pousa na ilha três vezes por semana, quando o tempo permite. Em nenhum momento precisamos mostrar documentos: no embarque, perguntei a ela se precisávamos mostrar os passaportes e a resposta, simples, veio com um sorriso: não precisa, eu conheço vocês. Como se fôssemos velhos amigos. Antes de embarcar no teco-teco que nos levaria de volta, ainda recebemos das mãos da nossa anfitriã um "certificado" de nossa passagem pelo Ártico assinado pelo próprio comandante do avião. Delícia de lembrança que só faz sentido (e faz todo o sentido) entre amantes do Círculo Polar.

domingo, 3 de fevereiro de 2013

Primeiras Impressões da Terra do Gelo

Ah, Islândia! Chegamos já quase no final do dia - nessa época, às 18h já é noite escura. A temperatura até que estava agradável: 4 graus, acima da média e da minha expectativa.
Uma das primeiras coisas que chamam a atenção é a língua, um emaranhado de símbolos e de sons difícil de decifrar (e mesmo de pronunciar). A segunda coisa que chama a atenção é quando se abre uma torneira. Não a água fria, que dizem vir diretamente das geleiras e que é a mais pura da Europa, melhor que muita água mineral; deve até ser. Mas a água quente... Eles dizem que também é potável. Porém, vem diretamente do subsolo vulcânico da ilha, então é bem quente e - principalmente - tem um cheiro de enxofre que impregna todo o ambiente! A sensação de aspirar o ar enquanto se toma um banho de chuveiro é indescritível! Dizem que a gente se acostuma com algumas semanas, mas não teremos tanto tempo.
Uma das iguarias da Islândia é hverabrauð, uma espécie de bolo assado tipicamente em buracos na terra, aproveitando a energia geotérmica. Achamos um supermercado onde compramos coisas para o nosso jantar, incluindo uma bandeja de hverabrauð. O negócio vinha com instruções vagamente incompreensíveis para ser colocado no forno. Resolvi aquecer no microondas, o único forno disponível. Bem, o tal hverabrauð parece ser bem gostoso... quando assado. O que acabamos comendo estava cru! Mas pelo menos sei que preciso dar um jeito de manter os próximos em alguma condição que simule o calor do interior de um vulcão antes de comê-los.